A atitude de jogar lixo pela janela do automóvel em uma estrada resume toda uma situação na qual vivemos e vivenciamos hoje. Que posicionamento tal pessoa tem perante a natureza, o bem coletivo e o resto da humanidade, quando resolve arremessar algo para livrar-se dele? Como se o simples fato de ultrapassar os limites do carro pelo portal que constitui-se a janela, o objeto fosse desintegrar-se, resolvendo o problema. O fato é que a resolução do pequeno problema pessoal e momentâneo é transferido e socializado. A questão assim, com o referido gesto, passa a ser de todos.
É um pequeno gesto, pequeno mas errado, e que no entanto simboliza a postura de uma sociedade quando o assunto é meio natural e coletivo.
Posturas como essas ganham corpo e trazem resultados desastrosos para todos. A atitude quando está voltada para o bem coletivo, pode evitar muitos problemas e economizar enormes recursos humanos e financeiros.
Os deslizamentos de encostas nas cidades brasileiras talvez não pudessem ser impedidos, mas as dezenas de vítimas que essa catástrofe natural carrega seriam evitados com medidas simples. O setor de planejamento das prefeituras, através de estudos, pode facilmente identificar as áreas de risco e impróprias a ocupação e expansão urbana. Cabe ao poder público fiscalizar e coibir construções nas áreas identificadas.
Possuímos técnicos tanto em número como em capacitação para realizar diagnósticos em áreas urbanas, apesar da complexidade que o tema impõe. Com exames de solo, geológicos, e uma análise ambiental pode-se prever o comportamento de uma determinada área. Encostas podem ser instáveis, como podemos presenciar via TV, só aí já justificaria a restrição da cidade subir morros. Mas existem também questões de ordem climática e ambiental. As encostas dos morros funcionam como um amortecedor do calor. Com a cobertura vegetal preservada, ocorre uma troca com o ar aquecido vindo dos concretos e tijolos, favorecendo a diminuição da temperatura na cidade.
Outra ação que contribue muito com o aumento da temperatura em nossas cidades é sem dúvida nenhuma a impermeabilização do solo com o uso do asfalto, concreto e outros materiais que tomam totalmente o espaço do verde. Todos os materiais que refletem e guardam o calor do sol, irradiam por várias horas, mesmo depois do crepúsculo. O calor causado por esse isolamento do solo com a atmosfera pode gerar muito desconforto, porém constitui-se um problema menor se comparar-mos com a impossibilidade do solo em receber as águas da chuva, evitando a infiltração. As consequências também assistimos pela imprensa com várias ocorrências pelo país e também no exterior. As enxurradas não encontram áreas para infiltrarem no solo, transformando ruas em rios. Caso crônico da cidade de São Paulo.
Encontramos exemplos semelhantes, porém com outras consequências. A população de Maringá viu o nível do seu lago municipal baixar devido a pouca contribuição de águas que deveriam infiltrar em seu entorno próximo e estavam impedidas pelo grande número de construções e da pavimentação excessiva do solo. Uma simples ação de planejamento, ou da falta dele.
Todos nós devemos tomar consciência sobre o que cada ato individual ou coletivo pode trazer de conseqüências. O poder público é uma parte do todo, um instrumento, ele não pode tudo.
O esforço deve mirar na solução mais perene do problema. A idéia de sirenes recentemente instaladas em comunidades de risco no estado do Rio de Janeiro, com o intuito de avisar a chegada de um temporal, soa, com o perdão do trocadilho, no mínimo irônico. Instalaram as sirenes, mas os “bunker” não foram construídos para as pessoas protegerem-se do ataque que vem dos céus. A chuva, que se anuncia como inimigo pelos auto falantes, deveria ser tratada de forma diferente, ao invés disso vamos continuar atirando lixo e entupindo bueiros.