Passamos pelo menos um terço de nossa vida em nossas casas. Ela é nosso refúgio para o descanso depois de uma estafante jornada de trabalho ou de horas nos bancos escolares. Precisamos ter uma referência de retorno. Sem ela, nosso equilíbrio emocional fica seriamente prejudicado. Nossas referências espaciais se estabelecem a partir de nosso lar. Esse porto seguro nem sempre teve o jeito que conhecemos atualmente. Caso façamos um pequeno balanço de como o homem pensou sua casa somente nos últimos 500 anos, vamos constatar grandes mudanças.
Os índios, nossos primeiros habitantes, moravam em ocas feitas de palha. Um único ambiente abrigava uma ou mais famílias. Implantada em uma clareira no meio da floresta, esse tipo de habitação apesar de muito simples, estava perfeitamente integrada ao meio ambiente.
Os bandeirantes, habitantes exploradores, possuíam uma casa que oferecia abrigo e defesa contra o meio hostil. Poucas janelas e uma planta simétrica denunciavam seu modo prático de levar a vida.
As casas do Brasil colonial que povoavam as nossas primeiras cidades, já esboçavam uma sofisticação maior que a dos avós bandeirantes, porém com um requinte ainda pequeno. Graças ao pouco desenvolvimento técnico-construtivo herdado dos portugueses, as casas desse período eram feitas muito estreitas, pois apoiavam-se umas as outras. Por isso vemos nas cidades históricas, construções sem recuos laterais, ou seja, coladas lateralmente umas as outras. São casas estreitas e muito compridas, pois precisam conter em seus ambientes quartos e salas.
Novas técnicas nos anos oitocentos permitiram o desenvolvimento de novas tipologias arquitetônicas. Casas melhor elaboradas, sob o ponto de vista de projetos, foram surgindo. O comportamento social do século dezenove fica claro na arquitetura mais uma vez, evidenciado na organização da planta das casas. Os dormitórios dos filhos homens possuíam aberturas como portas para o exterior. Podiam assim ter livre acesso, sem controle de seus horários por parte dos pais. O que não acontecia quando se tratava das filhas, seus quartos, os femininos, tinham um único acesso e esse ficava voltado para a vigilante porta dos dormitórios dos pais.
No século vinte nossas casas destinavam uma sala só para visitas. A sala estava sempre pronta e arrumada para receber quem chegasse a qualquer hora. Hoje, muito pela redução do espaço, essa sala praticamente desapareceu. Poucas pessoas tem por hábito fazer visitas sem antes avisar e acontecendo, irão compartilhar os mesmos ambientes de convivência familiar.
A partir de 1950, a TV começou entrar nas casas com a proposta de trazer o mundo aos nossos lares e, talvez por isso, diminuir nossos espaços. Ficamos mais mudos, porém juntos na sala. O que não aconteceu com a chegada da internet. O mundo foi para ao dormitório. Estamos com uma fonte de informações fantásticas dentro de um aparato eletrônico, porém não compartilhamos com mais ninguém da família.
Dizem até que no futuro bem próximo, não precisaremos sair de nossas casas, ou quartos, para ir aos escritórios. Falam da maravilha de se trabalhar em casa.
Como serão nossas casas do futuro? De abrigo e refúgio de um sistema social maior, como a cidade, passa a casa a se relacionar com uma dimensão maior e com pontos de contatos pouco visíveis. Construímos um caminho que iniciou com o profundo contato com a natureza próxima e circundante para uma via que nos leva a um mundo distante, virtual e intangível. O espaço para o encontro está perdendo espaço. Encontro que é tão importante para o nosso crescimento como comunidade e na transmissão dos valores mais simples às futuras gerações.