Esta semana li um texto de Paul Taylor, através de um site que tratava sobre a arte e a verdade. Este artigo traçava algumas considerações sobre fidelidade, ficção no caso literário, e realidade. Palavras e conceitos nada herméticos e longe de serem facilmente conceituados. Quer dizer, se fizermos uma pausa e tentarmos conceituá-los, certamente gastaremos um bom tempo nessa discussão.
Na vida e na arte, o real e a ficção podem estar misturados, como em nossos sonhos ou despertares, e a fidelidade pode assumir diversas formas. E não estou me referindo ao campo ético-moral, mas mesmo aí já caberiam discussões filosóficas acaloradas. Gosto da expressão: A arte é livre! Mas ela só existe porque alguém a criou para que outra pessoa a contemple. Claro, pois a arte não sabe de si, não pensa, é inanimada por si só. É livre como expressão e, também, livre quando e como está sendo interpretada. Podemos dizer então que é uma ideia, ou melhor, várias ideias.
Quando vi a espetacular obra de Pablo Picasso exposta em uma ala próxima do Museu do Prado em Madrid, confesso que fiquei emocionado. Guernica é uma obra monumental em suas proporções, cheia de ideias, símbolos espanhóis e carregada de significados. Mas, além da pintura, consagrada como uma das mais importantes obras do século XX, estão expostos inúmeros rascunhos e desenhos feitos por Picasso que serviram de ensaio para ele chegar na grande obra. Pedaços de papéis e até guardanapos, cada um com um detalhe da obra, mostram que o pintor não desperdiçou nenhum momento de inspiração, quer onde estivesse. Todo esse rascunho disposto em galerias, obedecendo a uma ordem cronológica, acredito, até culminar na grande obra em um ambiente ao final daquele corredor-galeria. Cada pequeno papel, com uma cena, fez parte do processo criador do pintor andaluz, culminando no grande painel, ou quadro de dimensões gigantes. O autor quis retratar a tragédia que caiu sobre a cidade de mesmo nome, no norte da Espanha. A pequena Guernica foi bombardeada por aviões alemães (nazistas) a serviço de Franco por ocasião da Guerra Civil Espanhola, ficando arrasada. Conta a lenda que em uma das visitas que recebia da polícia alemã, quando da ocupação nazista em Paris, local onde viveu durante muitos anos, um oficial o perguntou, referindo-se ao quadro: – “Foi você quem fez isso? A resposta: – “Não, foram vocês”.
Nessa obra o autor retratou algo real e verdadeiro, mas com a visão de um artista. Foi fiel à sua arte, técnica e senso estético. Tomou emprestado alguns símbolos espanhóis, como o touro e juntou muitos outros elementos no famoso quadro. O painel está lá, inerte e estático. Conta uma estória sem nenhum som e nenhuma ordem que possa articulá-la para uma fácil compreensão. Mas como ficar parado em frente a ele e não esboçar qualquer reação? Pintado em preto e branco, possui uma força fora do comum. Verdade e ficção se misturando entre o negro, o branco e o cinza de seus desenhos, como a evidenciar a falta de vida. Picasso deixa claro, com a ausência de cor, o seu desgosto pela situação que retrata.
Paixões, emoções e diferentes visões do mundo tornam difícil uma discussão sóbria sobre a fidelidade da arte e sua verdade, ou suas verdades. A arte é livre, contudo, em minha opinião, torna-se verdadeira quando é genuína e ancorada em seu tempo.